29.7.08

Calvin&Hobbes


Calvin&Hobbes nunca deveria ter sido grande - uma banda desenhada protagonizada por uma criança de seis anos, cínica, anti-social e propensa para o mal cujo único amigo é um tigre de peluche com uma natureza ambivalente e com actividades diárias que a colocam numa posição de antagonismo contra o resto do mundo não reúne nenhuma condição para o sucesso.

A mestria do autor, Bill Watterson, que conseguiu que Calvin&Hobbes fosse publicado entre 1985 e 1995 em centenas de jornais de todo o Mundo e editado em colectâneas.

Em Calvin&Hobbes, vemos como é possível transportar para o formato BD temas complexos e abstractos relacionados com a existência humana e com os fenómenos que nos afectam enquanto indivíduos - ao mesmo tempo que assistimos também às mais longínquas divagações e devaneios de um rapaz de seis anos que gosta de visualizar dinossauros, naves espaciais e fenómenos da natureza como pano de fundo das situações do dia-a-dia.

Dificilmente se pode colocar algo com Calvin&Hobbes ao lado da grande maioria das bandas desenhadas publicadas na imprensa - seria uma enorme injustiça para com a obra de Bill Watterson, Calvin&Hobbes vai muito além da função de divertir e abre caminhos que nunca pensaríamos possíveis no espaço confinado de uma tira de quatro vinhetas ou numa página de BD - a capacidade de apresentar correntes artísticas e o seu meio, religião, psicologia humana e desejos infantis levados ao extremo através das conversas e acções de um rapaz de seis anos com o seu tigre de peluche demonstram que o autor conseguiu transpor a linha que separa o entretenimento da arte e imortalizou uma aparente banda desenhada para crianças ao ponto de a levar aos mais altos patamares da BD.

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25.7.08

Uzbequistão

Uzbequistão...esse país da Ásia Central, antiga república da União Soviética, é tão...tão........faltam-me as palavras, mas não ia dizer nada de bom. Sim, tal como o vizinho Turquemenistão, o Uzbequistão optou por seguir a via do totalitarismo onde o poder está concentrado no presidente e no seu círculo íntimo, aliás o presidente é o mesmo desde 1990, uma vez que transitou calmamento do cargo "soviético" para "presidente uzbeque".
Massacre de Andijan, Maio de 2005; número de vítimas mortais desconhecido, possivelmente acima das 600.
Eu sei, eu sei, devia meter-me onde sou chamado...mas o Uzbequistão é um dos piores exemplos que se pode dar no que diz respeito ao tratamento dos cidadãos. Não só a tortura é uma prática comum por parte das forças da "ordem" ["ordem" governamental, leia-se], como as autoridades obrigam milhares de crianças e de estudantes a trabalhos forçados nas plantações de algodão, muitas vezes sem pagamento e sem protecção de qualquer espécie.
Pois bem, aqui temos mais um exemplo de como alguém que tenha a infelicidade de nascer no Uzbequistão tem a sua vida deliberadamente prejudicada por quem comanda o país - não só os principais meios de comunicação estão nas mãos do estado, como a própria internet é alvo de um controlo sufocante. Uma vez que todas as linhas de acesso à internet pertencem ao estado, é fácil para as autoridades uzbeques bloquearem e filtrarem todos os conteúdos que lhes parecem "ameaçadores". Imaginem como seria se tentassem aceder a um site que fosse considerado "perigoso para a integridade nacional" e que a tentativa de o visitar ainda os denunciasse e lhes garantisse um interrogatório por parte de polícias à paisana.
É algo que, vivendo numa sociedade democrática, não conseguimos imaginar, mas que acontece - não só no Uzbequistão, como noutros países, os mais óbvios são a China e o Irão. Infelizmente para os uzbeques, a censura é de tal forma eficaz que é preciso ser-se extremamente hábil para a contornar - enquanto nós podemos consultar livremente o site Ferghana.ru que apresenta várias notícias consideradas "incómodas" para as autoridades uzbeques, alguém que viva em Tashkent ou em Samarcanda terá muitos problemas se quiser aceder à informação ali apresentada.
Pior ainda, as autoridades uzbeques nunca tiveram qualquer problema com os Estados Unidos ou com a Rússia - embora se tenham afastado das tentativas de se aproximarem de Wahsington desde o massacre de Andijan, caíram nos braços do Kremlin que os acolheu com todo o gosto, afinal é mais um integrante do seu "estrangeiro próximo" - o que significa que uma intervenção externa no sentido de pôr fim a esta situação é impensável.
Isto significa que para o comum cidadão uzbeque, a maior ameaça não vem de grupos terroristas ou criminosos comuns mas do seu próprio estado - uma forma muito macabra de terrorismo.

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24.7.08

24 de Julho

Toda a gente conhece a Avenida 24 de Julho em Lisboa mas muito poucos conhecem a razão por trás do seu nome - tal como o ano em que se deu esse 24 de Julho.

Trata-se de uma das datas mais ignoradas da História de Portugal e que, como muitas outras, fazem parte de um contexto mais alargado que é impossível de explicar em algumas linhas. Ainda assim, o dia 24 de Julho representa um evento muito importante para o país e quando um país ignora o seu passado, não está em condições de encarar o seu futuro.

24 de Julho de 1833 foi o dia em que as tropas liberais comandadas pelo Duque da Terceira entraram em Lisboa, após a conquista do Algarve, a travessia do Alentejo e a vitória sobre o general Teles Jordão em Almada. Portugal encontrava-se em guerra civil, entre os absolutistas leais a D. Miguel e os liberais leais a D. Pedro, que abdicara do título de Imperador do Brasil para regressar a Portugal e comandar a ofensiva contra a casa real portuguesa. A guerra civil ganhou um rumo decisivo a favor dos liberais que iriam vencer o conflito no ano seguinte, o qual terminou oficialmente com a assinatura da Convenção de Évora Monte.

Na história não pode haver "bons" nem "maus" e não podemos rotular liberais e absolutistas num espectro preto e branco - é um erro grosseiro e ao cometê-lo corre-se o risco de prejudicar o nosso olhar sobre o presente e sobre o futuro.  Do ponto de vista de quem escreve em 2008, não posso deixar de considerar a vitória liberal como positiva para o país - ou talvez deva dizer, "menos negativa". A corrente absolutista rejeitava a nova organização política que se disseminara pela Europa desde 1789 e que, ironicamente, impôs ideias liberais através das Guerras Napoleónicas. O seu contributo não pode ser descartado e o apoio dado pela França e pela Inglaterra à facção liberal foi fulcral ao seu triunfo - pode-se então questionar se a vitória liberal em Portugal não teria sido apenas uma manipulação daqueles dois países que, face à indefinição de Portugal e Espanha não estavam dispostos a perder a sua influência na Península Ibérica e decidiram intervir.

É possível, mas num país pequeno como Portugal que recentemente tinha concedido a independência ao Brasil - a maior e mais importante possessão colonial portuguesa - isolar o país dos seus vizinhos iria trazer consequências nefastas para o seu futuro. Um eventual triunfo absolutista em Portugal, não só iria atrasar as muito necessárias intervenções na ordem do reino [em que Mouzinho da Silveira se tinha destacado, até ser afastado do governo antes do início da guerra civil] como iria colocar o país numa situação perigosa, face às maiores potências da Europa. Decorridas as invasões francesas e a ocupação britânica, Portugal não podia arriscar continuar afastado da corrente que varria a Europa, como se de um recanto isolado se tratasse.

É indiscutível que o período que se seguiu ao final da guerra civil de 1832-34 foi de enorme agitação e instabilidade em todos os sectores da sociedade - de uma magnitude que hoje não compreendemos uma vez que vivemos numa sociedade muito diferente daquela em que estes acontecimentos se desenrolaram - mas não deixa de ser verdade que ao olharmos para a História, conseguimos compreender que são necessárias mudanças dolorosas para assegurar uma evolução positiva - no caso de Portugal não seria tão positiva como se pretendia, ainda assim julgo que o balanço foi positivo.

Por isto, a data de 24 de Julho está ligada a um dos períodos mais importantes da História da Portugal e deixá-la no arquivo é errado - tal como outras datas daquele período, deveria ser assinalada oficialmente e talvez não fosse descabido estabelecer o dia 24 de Julho como o feriado municipal de Lisboa, em vez de um "santo" do século XII.

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23.7.08

Bulgária com fundos europeus suspensos

Especificamente, são referidas a falta de empenho das autoridades em pôr cobro ao crime organizado, à corrupção e à fraude existentes no poder executivo, bem como a discrepância entre o que é legislado e o que é feito. Os €500 milhões que acabam de ser suspensos dizem respeito a fundos que fazem parte do acordo de pré-adesão, mas se a Bulgária não cumprir com o que lhe é exigido, podem estar em risco os €4,5 mil milhões que são lhe destinados ao longo dos próximos cinco anos.
Hoje é publicada a versão final do relatório, que foi alvo de alguma suavização de forma a aliviar a dureza da linguagem usada, mas a mensagem que passa para os parceiros comunitários da Bulgária é esta - o dinheiro não está a ser bem aplicado e está a ser desviado em total desrespeito para com os países dadores e para com os cidadãos.
 
A Roménia foi igualmente alvo de avisos, não tão ameaçadores quanto os que foram feitos à Bulgária, é certo, mas ainda assim, os tribunais romenos não são suficientemente diligentes nas condenações por corrupção e por fraude - aparentemente, mais de 90% dos casos são condenados à pena mais baixa possível.
Já em 2004 se dizia que o alargamento de então a dez novos estados estaria a ser feito demasiado depressa e que não só a UE não teria capacidade de absorver os novos membros, como estes poderiam não estar [todos] prontos para se tornarem membros de pleno direito. Em 2007, foi a vez da Bulgária e Roménia aderirem à UE, depois de em 2002 não terem sido considerados como preparados para aderir em 2004. Aparentemente, havia alguns aspectos importantes que indicavam que estes dois países não estariam ainda preparados para aderir em 2007, mas é frequente estes aspectos passarem em claro em nome de objectivos políticos - para os dois lados, claro.

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Rocko's Modern Life



Aqui está a abertura de um dos meus desenhos animados favoritos do final da infância. Rocko's Modern Life é uma produção Nickelodeon e é uma série na linha de Ren&Stimpy que partilha bastantes traços com aquela dupla mas que tem também uma série de aspectos divergentes. A personagem principal é um marsupial australiano [redundância?] chamado Rocko que vive sozinho com o seu cão, Spunky. O melhor amigo de Rocko é um boi chamado Heffer [que...foi...adoptado, uma vez que mais tarde nos é revelado que o seu pai fugiu e que a sua mãe é um assento de automóvel...] e os seus vizinhos são um casal de sapos constituído pelo senhor e senhora Big Head [traduzidos para português como senhor e senhora Tola Grande].

O infeliz Rocko passa por uma série de situações que não combinam nada com a sua pacífica pessoa - desde ser seduzido pela senhora Big Head quando o marido está fora [situação que acabou com o nosso amigo a ter de ajudar a senhora sapo quando os globos oculares desta foram tragicamente enrolados pelo vídeo depois de ela lá meter a cabeça] até uma possível deportação por não se ter legalizado, sem esquecer a sua operação ao apêndice [realizada por uma ex-dentista maneta que usa um gancho como mão] e uma viagem em que o avião onde seguem perde todos os motores depois de ter passado por entre duas montanhas e as malas são disparadas de canhão para um mundo distante.

Ah, Nickelodeon...grandes desenhos animados nos trouxeste!

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Batman


Não me considero um grande fan de super-heróis, mas o Batman é talvez o único desse universo que eu consigo respeitar e apreciar. Uma figura que leva uma vida dupla, de milionário famoso durante o dia e de justiceiro evasivo durante a noite e que desenvolveu por si próprio os seus métodos e a sua filosofia é alguém que deve ser admirado.

Embora não tenha acompanhado regularmente a banda desenhada, os dois primeiros filmes sobre este super-herói, dirigidos por Tim Burton e com Micheal Keaton no papel principal estão entre as obras cinematográficas que eu mais aprecio. Já os que se seguiram, nem por isso. Se Batman Forever, de Joel Schumacher e com Val Kilmer no papel do Morcego ainda conseguiu ser um Batman no verdadeiro sentido da palavra, Batman and Robin esteve muito longe disso.

Quanto a Batman Begins, de 2005, é um pouco difícil tratá-lo como um filme sobre Batman - além de aborrecido, afasta-se de tal forma do Batman que eu admiro ao ponto de o tornar quase irreconhecível. O filme de Christopher Nolan com Christian Bale [O Império do Sol] no papel de Batman perde totalmente o pano de fundo que os dois primeiros filmes deram ao Morcego e é pouco mais do que um filme de acção com um super-herói, que por acaso é Batman.

Não estou com expectativas particularmente boas para The Dark Knight, tendo em conta o que vi em Batman Begins. Porque é que é preciso um realizador como Tim Burton para termos um filme do Batman que seja rico em matéria visual e com uma história suficientemente atractiva para a podermos considerar como uma verdadeira adaptação de banda desenhada?

Haverá alguém melhor para fazer de vilão do que Jack Nicholson [Joker] ou Danny de Vito [Penguin]? Ou será possível encontrar outra como Michelle Pfeiffer para um papel tão diabólico quanto necesário que é o da Cat Woman? E quem melhor do que Tim Burton para criar Gotham City, a cidade com o ambiente mais pesado e mais noir do universo da banda desenhada? Em Batman Begins, Gotham City não chega a ser uma sombra daquilo que conhecemos...

Sem dúvida, nenhum super-herói consegue impressionar mais do que Batman, o homem que alcança tudo através dos seus próprios meios - o bat-sign no céu nocturno de Gotham City é possivelmente o melhor início de qualquer história em formato visual.

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22.7.08

Detenção de Radovan Karadzic


Um dos criminosos de guerra mais procurados da Europa foi finalmente detido - Radovan Karadzic foi ontem preso em Belgrado, 12 anos depois de ter sido indiciado por genocídio e crimes contra a humanidade cometidos durante a guerra civil da Bósnia, quando Karadzic liderou a facção servo-bósnia e, juntamente com o seu comandante militar, Ratko Mladic [que ainda está em liberdade], foi um dos principais mentores da chamada "limpeza étnica" que resultou no assassinato de milhares de civis entre 1992 e 1995 na Bósnia-Herzegovina.

A detenção de Karadzic, que estava a viver em Belgrado sob um nome falso e a trabalhar numa clínica privada onde exercia medicina alternativa, pode dar um contributo fundamental à candidatura de adesão da Sérvia à União Europeia, já que a entrega de Karadzic e de Mladic é uma condição para o início das negociações de adesão daquele país balcânico.

Se é positivo que mais um criminoso de guerra que protagonizou o pior conflito europeu desde a II Guerra Mundial [relembro que na guerra da Bósnia, foram mortas mais de 200 000 pessoas, ao longo de três anos que foram protagonizados por tentativas de separação étnica entre sérvios, croatas e muçulmanos], não deixa de ser vergonhoso que tenham sido necessários 12 anos para apanhar o homem mais procurado da Europa. A Sérvia foi várias vezes acusada de não fazer o suficiente para deter Karadzic e Mladic e infelizmente, os dois homens gozam do apoio de um número significativo de pessoas em vários estratos [incluindo a Igreja Ortodoxa] que lhes deram apoio e esconderijo desde que o Tribunal Internacional para a ex-Jugoslávia os indiciou, colocando assim em risco o futuro do seu próprio país.


É pena que a justiça não seja devidamente aplicada a todos os envolvidos - depois da morte inesperada de Milosevic em Março de 2006 e da detenção de Ante Gotovina em Dezembro de 2005, nem todos os procurados por crimes contra a humanidade cometidos durante a guerra dos Balcãs. Resta esperar que sejam condenados a penas exemplares, de forma a enviar o melhor sinal ao Mundo.

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21.7.08

Apedrejamentos no Irão...mas é tudo legal

No Irão, oito mulheres e um homem foram condenados à morte pelo apedrejamento. Sim, ainda há pessoas que são executadas através do apedrejamento [notem que eu não disse apenas "ainda há pessoas que são executadas"]. De acordo com esta notícia, "The eight women sentenced, whose ages range from 27 to 43, had convictions including prostitution, incest and adultery, Reuters news agency reported. The man, a 50-year-old music teacher, was convicted of illegal sex with a student, reports said."
Aparentemente, nenhum dos "crimes" foi cometido sob coacção nem vitimou ninguém, o que contribui ainda mais para vermos como certos países parecem não saber tratar os seus cidadãos como seres humanos - sendo o Irão uma República Islâmica [oh por favor...uma república de base religiosa não passa de uma mentira a todos os níveis] e se de acordo com as interpretações da lei islâmica, é aceitável apedrejar pessoas até à morte por crimes que não vitimam ninguém, isso torna-se numa prática aceitável se for ordenada pelo poder judicial.
É justo dizer-se que cada país deve tratar dos seus próprios assuntos internos, mas, e correndo o risco de ser rotulado de "ocidental arrogante" ou até mesmo de "neo-colonialista/imperialista", eu prefiro pensar que existem valores universais comuns a toda a Humanidade e que estão acima de correntes religiosas e de doutrinas políticas - caso contrário, nenhuma ideia conseguiria sair do seu local de origem e encontrar eco em locais distantes.
Não é altura de usar adjectivos como "retrógrado" ou de referir paradoxos como "tentativas de modernização que coexistem com métodos medievais" - isso é partir do princípio que todos os países se encontram num processo imparável a caminho do "progresso" e que eventualmente, vamos todos ser regidos pelas mesmas leis.
Acontece que países como o Irão [e já agora, a Arábia Saudita, antes que venham dizer que os aliados dos EUA também fazem coisas destas] consideram que abolir tais práticas seria apenas vergarem-se à pressão do ocidente e isso seria visto como uma humilhação perante o Mundo - o que é compreensível, afinal não criaram um dos estados mais grotescos do Mundo para depois suavizarem as leis devido às pressões externas.
Se no Irão, práticas como a execução por apedrejamento são vistas como normais, que legitimidade temos nós para os criticar? Afinal, os EUA também cometem violações dos Direitos Humanos [numa escala ligeiramente menor], porque é que o Irão não as pode fazer? Claro que partir do princípio que esta medida goza do apoio da maioria dos iranianos é muito imprudente. Afinal, a maioria dos húngaros detestava a ocupação soviética e ninguém os foi ajudar quando estes se levantaram contra o invasor. O mais importante aqui é saber porque razão é que um estado como o Irão ainda existe? Não se trata apenas de práticas judiciais desumanas, trata-se de todo um país que é uma distorção total daquilo que um país deve ser [e já estou a ouvir "deve ser como quem...como os Estados Unidos?"], uma vez que é um estado baseado numa religião e com intenções de manter o seu status quo através da venda de combustíveis fósseis.
Dificilmente se podem esperar atitudes de maior respeito para com os Direitos Humanos vindas do Irão - um país onde os seus dirigentes mais poderosos se dignam a ditar o que é moralmente ofensivo - e o pior de tudo isto é que não se trata de um pequeno país sem projecção mundial, trata-se de um país de grandes dimensões, com uma intervenção directa no seu vizinho Iraque, que financia movimentos terroristas no Médio Oriente e que ainda serve de orientação espiritual a muitos que pretendem instituir um totalitarismo com base na religião islâmica...onde, entre outras coisas, há pessoas condenadas à morte por adultério.

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A distorção da democracia


Nos últimos dias temos sido constantemente bombardeados com notícias, opiniões e comentários sobre um tiroteio que aconteceu num bairro social do concelho de Loures - de forma resumida, parece que nesse bairro existem duas "comunidades", a "comunidade cigana" e a "comunidade africana", o que deixa de fora quem não cumprir nenhum dos requisitos para ser "membro" de qualquer uma dassas "comunidades". Ora, segundo nos dizem, houve um desentendimento que levou à violência inter-étnica [estamos tão cosmopolitas em Portugal, até já temos os problemas de países maiores e mais ricos!] e que culminou numa invasão e destruição em grande escala das casas da "comunidade cigana", cujos "membros" abandonaram as habitações e plantaram-se em frente à Câmara Municipal de Loures reivindicando novas habitações fora daquele bairro - tudo ilustrado por imagens de "membros" daquela "comunidade" que se dizem perseguidos e afirmam estar a viver em condições sub-humanas.


O que é que está errado aqui? Tudo, de uma ponta à outra.

Para começar, não existem "comunidades" em Portugal, existem 10,4 milhões de cidadãos que são iguais perante a lei [isto nem sempre acontece...] mas que insistem em tratar de forma diferente. A partir do momento em que dividem os cidadãos em diferentes "comunidades", frequentemente a partir de factores como a origem, estão a abrir caminho a fracturas graves e em vez de denunciar possíveis situações de discriminação, estão a apresentar essas pessoas como sendo irremediavelmente diferentes dos outros, logo, susceptíveis de serem tratadas de forma diferente.

Em relação ao tal bairro de Loures, nem sei por onde começar: desde pessoas que não mostram o mínimo de respeito pela sociedade onde vivem e atropelam a lei por se sentirem impunes, passando por justificações académicas totalmente desenquadradas e terminando em meios de comunicação social que preferem fazer uma espécie de telenovela de tudo isto, há algo que sobressai - como se nos estivessem a dizer "eles são diferentes, temos de ser compreensivos", o que na prática significa "neste caso, a lei é diferente", e a partir do momento em que se admite a formação de "comunidades" [que não existem], entra-se num vazio perigoso onde rapidamente a lei é posta de parte e entram em campo teorias sociais que em nada contribuem para a resolução deste problema - porque razão existem tantas armas naquele bairro? Porque motivo um desentendimento levou a um tiroteio? É justificável que tenha havido um tiroteio apenas com o argumento de que são "comunidades" que "não se dão bem"? Já agora, porque não são sinceros e não dizem abertamente que a violência faz parte da "cultura cigana"? É claramente o que pensam e seria uma forma de clarificar tudo aos olhos do público e de justificar o tratamento que as autoridades dão aos "membros" da chamada "comunidade cigana"...

Ou estamos apenas perante uma desresponsabilização total das autoridades e das pessoas envolvidas, acompanhada da ignorância de muitos que acompanham estes casos e que parecem estar convictos de que se deve tratar de forma diferente pessoas que são "ciganos" e "africanos", sem aplicar a lei e permitindo que os bairros sociais se tornem locais sem ordem para depois afirmar que "não se podem criar guetos", quando na verdade, não estão preparados para tratar as "comunidades" com a mesma lei com que a maioria da população portuguesa é tratada?

14.7.08

União do Mediterrâneo


Algumas décadas mais tarde do que devia, eis que surge uma tentativa de formalizar a aproximação entre União Europeia e os países do Mediterrâneo sul e Mediterrâneo oriental - notem que eu lhe chamei "tentativa de formalizar a aproximação", não lhe chamei "União", porque isso não é possível.

Aparentemente, reina o optimismo - parece próximo um acordo entre Israel e a Autoridade Palestiniana [só faltam o Hamas e o Hezbollah], anuncia-se o objectivo de levar a paz a toda a região, tal como se fez com a Europa, referem-se assuntos a abordar como a imigração, educação e segurança...sempre com o maior dos cuidados para não tentar impor elementos estranhos como "liberdade de imprensa/expressão", "democracia" ou "respeito pelos Direitos Humanos" e que pouco ou nada dizem a países como Marrocos, Argélia, Tunísia, Líbia, Egipto e Síria.
Depois de os estados membros da União Europeia terem percebido que do Norte de África não vinham apenas imigrantes mas que os contextos de pobreza dos quais eles fugiam [e quem é que não quereria de lá fugir?] são potenciais criadores de terroristas, chegou-se à conclusão que era imperativo mudar essas situações - mas só depois de se certificarem que não era possível fortificar a costa sul da Europa.
Acontece que existem vários pontos sensíveis a ter em conta: Israel e Palestina, que só por si são bem mais do que um ponto sensível, são uma verdadeira mancha dolorosa no panorama global; Líbano e Síria, com menos mediatismo mas ainda assim, uma situação onde durante anos um país dominou, de facto, outro mas só os países ocidentais praticam neo-colonialismo, atenção; Marrocos e o Sahara Ocidental, onde, oficialmente, não acontece nada de mal; Líbia, que já deixou de ser um estado "mau" e de um dia para o outro passou a ser "bonzinho" - apesar de Khaddafi ter recusado o convite de Sarkozy, uma vez que o ditador líbio vê na União para o Mediterrâneo uma tentativa de neo-colonialismo e de domínio europeu sobre os países árabes [refira-se que dominar outros países é coisa que Khaddafi nunca tentou, afinal ele nem poderes oficiais tem...].
Obviamente que não se pretendia provocar nenhum embaraço nem tratar de questões demsiado complicadas - Sahara Ocidental não existe, desrespeito da soberania iraquiana por parte da Turquia também não e, como já referi, nem pensar em falar em Direitos Humanos e democracia, o que está em jogo é demasiado alto para se perder tempo com particularidades que só interessam a alguns - afinal, Sarkozy quer deixar um legado para o futuro e pouco tempo depois do falhanço absoluto que foi a tentativa de ratificação do Tratado de Lisboa, criar a União para o Mediterrâneo não ficaria nada mal na História. 
Infelizmente, duvido que alguém vá tentar fazer alguma coisa quanto às pessoas nos países do Norte de África e do Médio Oriente que são presas e torturadas por "crimes" como criticar as autoridades locais...mas segundo dizem os entendidos, isso não faz parte da "cultura" local, por isso não devemos falar demasiado sobre isso, devemos, isso sim, tentar fazer algo pelas populações que habitam o Norte de África e o Mediterrâneo Oriental em conjunto com as autoridades locais...porque me parece que há algo de muito estúpido na parte final da última frase que escrevi?
Espero que Sarkozy e os outros líderes europeus estejam preparados para os EUA e para a nova presidência a partir de Janeiro - afinal, ninguém vai ficar agarrado à UE se de além-Atlântico vierem melhores contrapartidas.

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