Geórgia - Rússia: o cessar-fogo
Ao quinto dia, finalmente um cessar-fogo de ambas as partes. Não significa que a paz tenha chegado, significa que quem estava em vantagem cumpriu os seus objectivos e sente-se suficientemente seguro para determinar o que acontece a seguir. Afinal não foi preciso chegar até Tbilissi, embora me pareça que a Rússia conseguiu habilmente deixar muitas pessoas a pensar que iria invadir a totalidade da Geórgia, sobretudo com as contradições no que o Kremlin dizia. Mesmo assim, alguns combates continuaram após o anúncio de cessar-fogo por parte da Rússia, que se encontra numa posição de domínio em relação à Geórgia. Não sabemos ainda como vai evoluir a situação na Abecázia - o cessar-fogo irá pôr fim às acções dos separatistas? E como vão ser as consequências noutros territórios separatistas onde existem movimentos apoiados pela Rússia? Será que a Transnístria virá a seguir e vamos assistir a uma invasão russa da Moldávia? E um cessar-fogo com Moscovo a ditar condições, irá certamente punir os responsáveis georgianos mas duvido que algum responsável separatista ou russo seja punido por algum crime que tenha cometido - não me surpreenderia, quando vemos Putin alinhar no discurso de "vocês também o fizeram".
O resultado está dependente do que for decidido nos próximos dias, a reunião da NATO com a Rússia será determinante, já uma resolução do Conselho de Segurança sobre o assunto deverá ter pouco impacto, se tivermos em conta que precisa da aprovação da Rússia e que arrisca a tornar-se num intrumento de Moscovo.
Destaque também para a eventual importância do ocidente neste assunto: a Rússia queixa-se de que o ocidente continua a observar o seu país do ponto de vista da Guerra Fria, não reconhecendo as mudanças que atravessaram o país. Porém, o fim da Guerra Fria não significa que a Rússia, sucessora da URSS, abandonasse os seus interesses e deixasse cair a sua ambição de potência global - um país com o tamanho da Rússia e, muito importante, com os seus recursos naturais e capacidade militar, nunca pode ser enfraquecido ao ponto de perder capacidade de projecção. O que nos pode levar a pensar que o fim do período bipolar não significou uma mudança tão titânica no palco mundial como se possa pensar, embora durante alguns anos muitos tivessem pensado que a Rússia se iria tornar numa espécie de "Gandhi global", apenas porque dissolveu o Pacto de Varsóvia, retirou as suas forças militares dos países da Europa central e pôs fim ao regime soviético.
A Geórgia anunciou que vai abandonar a Comunidade de Estados Independentes [embora, na prática já lá estivesse a fazer muito pouco e a CEI nunca tivesse tido uma verdadeira presença como organização intergovernamental] mas por enquanto, as suas tentativas de aderir à NATO vão ficar no limbo. O ocidente sente-se um pouco confuso - talvez por ter pensado que a Rússia iria tornar-se num "amigo", quase como o Reino Unido e os EUA são "amigos" e mais tarde por ter pensado que a Rússia seria um "parceiro forte".
Não gosto de ver referências a uma "nova Guerra Fria", sobretudo quando vejo que para muitas pessoas, a expressão "Guerra Fria" significa pouco mais do que uma medição de forças, que é o que potências globais fazem, de formas mais ou menos discretas. Nesse aspecto, a "Guerra Fria" nunca teria terminado, simplesmente mudou de insígnias e alguns dos participantes mudaram de lado. Estou também curioso para ver o que vai mudar nos países da UE mais próximos da Rússia [Estónia, Letónia, Lituânia, Polónia] e na relação europeia com aquele país - vamos assistir a um verdadeiro esforço comum e a uma posição sólida da UE, capaz de demonstrar que é possível que 27 países consigam ter uma opinião e uma meta comum nesta questão?
Etiquetas: Abecázia, Cáucaso, Geórgia, Ossétia do Sul, Rússia
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