31.1.06

Desrespeito total pela Dinamarca

Em Setembro de 2005, um jornal dinamarquês, Jyllands Posten, publicou uma série de cartoons satíricos onde Maomé aparece desenhado como um terrorista e armado com um cinto de explosivos. Em Janeiro deste ano, os mesmos cartoons foram reproduzidos num jornal norueguês, até aqui nada de anormal. A reacção, porém não se fez sentir. Da parte das comunidades muçulmanas no país foram expressas opiniões furiosas que consideravam os cartoons como blasfémia, uma vez que a religião islâmica não permite a reprodução de imagens. As manifestações atingiram carácter oficial, quando as embaixadas de 17 países maioritariamente muçulmanos mostraram a sua indignação face àquela publicação.
No caso da Líbia, a embaixada foi encerrada. Na Arábia Saudita, está em curso um boicote a produtos dinamarqueses, em que o principal alvo é a multinacional do ramo alimentar Arla, a Segunda maior da Europa e que em apenas cinco dias já registou perdas consideráveis naquele país. Nos territórios palestinianos tiveram lugar manifestações dirigidas contra a Dinamarca, onde foram queimadas bandeiras dinamarquesas e foram proferidos apelos à guerra com aquele país. Ao mesmo tempo, clérigos islâmicos e autoridades de países maioritariamente muçulmanos fazem questão em obter não só um pedido de desculpas por parte do Primeiro Ministro dinamarquês, como ainda exigem que o governo da Dinamarca castigue os responsáveis.
Julgo que não preciso de dizer que a politização da religião é uma das maiores ameaças históricas que a Humanidade enfrenta no presente, enfrentou no passado e irá enfrentar no futuro. Sobretudo, quando aliado a objectivos políticos, tem lugar uma manipulação em larga escala da consciência religiosa dos indivíduos, como foi o caso. O que justifica que multidões venham para a rua queimar bandeiras dinamarquesas e apelar à violência contra um dos países mais pacíficos do Mundo e que tanto contribuiu e continua a contribuir para o desenvolvimento das regiões mais pobres do planeta? O envolvimento a nível oficial das autoridades de países maioritariamente muçulmanos indica ainda que os países em questão não efectuaram uma separação efectiva entre a igreja e o Estado e que os seus representantes estão envolvidos em actividades que vão muito além da sua competência. Este caso ilustra ainda a forma como uma vertente activista (numerosa) da religião islâmica desrespeita:
- a liberdade de expressão e de imprensa
- as crenças das pessoas envolvidas, uma vez que uma norma de conduta aplicável a uma religião não pode ser imposta a outras pessoas, ao abrigo de virtualmente todas as convenções de Direitos Humanos existentes à face da Terra; neste caso, a concepção islâmica de blasfémia que condena a elaboração de imagens foi vista como violada, quando o facto ocorreu num país democrático
- a separação de poderes na Dinamarca (e por extensão, nos outros regimes democráticos) ao exigir que o governo castigue os responsáveis, ou seja, a exigir promiscuidade entre poder executivo e poder judicial, ao mesmo tempo que atropela a liberdade de imprensa dos países democráticos
- um dos países com um dos índices democráticos mais elevados do Mundo, onde existe uma comunidade muçulmana respeitada pelas autoridades
- o próprio respeito que os 1200 milhões de muçulmanos pedem pela sua religião, ao dar um exemplo deplorável de fanatismo e de manipulação contra um país que nunca é alvo de hostilidades
Entretanto, a Comissão Europeia já alertou a Arábia Saudita para a violação das leis da concorrência ao abrigo das leis de OMC devido ao seu apelo a um boicote aos produtos dinamarqueses nos países maioritariamente muçulmanos. Aparentemente, as facções envolvidas neste protesto em grande escala serão concerteza semelhantes e/ou próximas às que em 2004 se manifestarem maciçamente contra a lei que proíbe a ostentação de símbolos religiosos nos edifícios públicos franceses.
Mais uma vez, uma facção extremista demonstra objectivos políticos ao tentar estender a sua influência além da sua comunidade, em claro desrespeito pelas leis dos Estados democráticos, ou por outras palavras, numa tentativa de deturpar a estrutura que permite a sua livre presença e prática dos seus preceitos num país tão tolerante e liberal como é a Dinamarca. Se quisermos ainda, liberdade de serem repressivos e intolerantes por parte de clérigos extremistas.

29.1.06

Notam alguma coisa estranha aqui?





E não, não são efeitos especiais, muito menos uma acção de marketing de um banco. Pela primeira vez, um dia cinzento em Lisboa tornou-se memorável!

27.1.06

Como impor um produto que não presta


A TV Cabo está presentemente a proceder à substituição das TV Box, os aparelhos que permitem descodificar o sinal dos canais condificados uma vez paga a assinatura, pelas novas Power Box. O que isto implica é muito simples, mediante um aluguer de €2,5, o espectador tem o equipamento base que lhe permite ter acesso não só aos canais codificados, mas também ao pacote Funtastic Life e ao serviço digital, onde se incluem o video on demand, multicâmaras, etc. Por outras palavras, um serviço que obteve resultados abaixo das expectativas e que a TV Cabo, na boa tradição saloia portuguesa, anunciou orgulhosamente como sendo o primeiro regular do Mundo, está agora fisicamente mais próximo, dispensando quaisquer encargos técnicos, bastando ao consumidor ser suficientemente tentado pelas campanhas de marketing e fazer uma simples chamada telefónica para o atendimento ao cliente da TV Cabo para poder usufruir de um serviço, que de serviço tem muito pouco e que não serve para quase nada.
Não fica por aqui, o pacote Funtastic Life fica também fisicamente mais próximo do consumidor, mais uma vez à distância de uma chamada telefónica. Apesar de os canais serem codificados, a barra inferior não deixa de mostrar a programação do canal, mostrando assim ao "consumidor forreta" o que ele está a perder. O que não deixa de ter a sua piada, uma vez que com ínfimas excepções, os canais em causa são, uma bela treta! Sobretudo quando neles brilha a Fox, o tablóide televisivo capaz de produzir uma lavagem ao estômago de maior alcance do que uma mistura de plutónio, detergente e diluente juntos. A TV Cabo prossegue com o seu domínio sobre a televisão por cabo com recursos a tácticas menos claras e mantém um serviço de internet de "banda larga" que seria mais eficiente se desempenhado por um caracol de idade avançada que perdeu uma perna após um tanque lhe ter passado por cima e de ter ficado com a coluna vertebral destruída depois de uma queda infeliz numa linha de montagem de automóveis...

15.1.06

Porque estamos na iminência de eleições...

Dedico esta cantiga de escárnio a todos os candidatos presidenciais.

Don Foão, que eu sei que á preço de livão,
vedes que fez ena guerra – daquesto soo certão:
sol que viu os genetes, come boi que fer tavão,
sacudiu-se [e] revolveu-se, al-
çou rab’e foi sa via a Portugal.


Don Foão, que eu sei que á preço de ligeiro,
vedes que fez ena guerra – daquesto son verdadeiro:
sol que viu os genetes, come bezerro tenreiro,
sacudiu-se [e] revolveu-se, al-
çou rab’e foi sa via a Portugal.


Don Foão, que eu sei que á prez de liveldade,
vedes que fez ena guerra – sabede-o por verdade:
sol que viu os genetes, come can que sal de grade,
sacudiu-se [e] revolveu-se, al-
çou rab’e foi sa via a Portugal.


Afonso de Méendez de Beesteiros 13 (CBN 1558)

2.1.06

Viagens na Minha Cidade...da promiscuidade, entenda-se

A Câmara de Lisboa não se pronunciou contra a demolição da casa onde viveu Almeida Garrett, em Campo de Ourique, para que no seu local seja construído um novo edifício. O proprietário é o actual Ministro da Economia que não pretende aproveitar a actual estrutura para o seu projecto.
Tratando-se de uma das figuras mais importantes da cultura portuguesa, eu gostava muito de perguntar aos indivíduos responsáveis por tal autorização (ou desinteresse) da CML, porque é que a casa de um dos maiores escritores portugueses pode ser demolida e substituída por um novo edifício? Porque não interveio a CML, mais cedo, para a sua recuperação (visto que se encontra em mau estado) e reconversão em casa-museu, como seria mais indicado? Que pretende a CML fazer em situações análogas, apagar as reminescências físicas de outras relevantes figuras da cultura portuguesa que tenham residido na capital?
Ou o "factor Garrett" é indiferente a isto tudo, e trata-se apenas de um caso de promiscuidade entre um órgão de poder local e um Ministro do Governo, que vai além do favorecimento partidário, visto que CML e Governo são dominados por duas forças políticas opostas (quer dizer, mais ou menos...)? Talvez o edifício estivesse condenado de qualquer forma, sendo o seu dono o Ministro da Economia...Seja qual for a verdadeira causa, a CML mostrou que não se interessa pelo património e que seja qual for o discurso, a sua gestão de Lisboa segue sempre a lógica da construção civil...
Em Viagens na Minha Terra, Garrett escreveu que dado o estado das ruas edifícios na Lisboa da sua época, os ministros e secretários de estados deviam ser obrigados a mudar de casa a cada seis meses para que as estruturas se mantivessem bem conservadas. Em 2006, aparentemente o seu argumento continua válido, só não esperava que se aplicasse à sua casa e à sua substituição por um novo prédio...macabro, não?

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