A distorção da democracia
Nos últimos dias temos sido constantemente bombardeados com notícias, opiniões e comentários sobre um tiroteio que aconteceu num bairro social do concelho de Loures - de forma resumida, parece que nesse bairro existem duas "comunidades", a "comunidade cigana" e a "comunidade africana", o que deixa de fora quem não cumprir nenhum dos requisitos para ser "membro" de qualquer uma dassas "comunidades". Ora, segundo nos dizem, houve um desentendimento que levou à violência inter-étnica [estamos tão cosmopolitas em Portugal, até já temos os problemas de países maiores e mais ricos!] e que culminou numa invasão e destruição em grande escala das casas da "comunidade cigana", cujos "membros" abandonaram as habitações e plantaram-se em frente à Câmara Municipal de Loures reivindicando novas habitações fora daquele bairro - tudo ilustrado por imagens de "membros" daquela "comunidade" que se dizem perseguidos e afirmam estar a viver em condições sub-humanas.
O que é que está errado aqui? Tudo, de uma ponta à outra.
Para começar, não existem "comunidades" em Portugal, existem 10,4 milhões de cidadãos que são iguais perante a lei [isto nem sempre acontece...] mas que insistem em tratar de forma diferente. A partir do momento em que dividem os cidadãos em diferentes "comunidades", frequentemente a partir de factores como a origem, estão a abrir caminho a fracturas graves e em vez de denunciar possíveis situações de discriminação, estão a apresentar essas pessoas como sendo irremediavelmente diferentes dos outros, logo, susceptíveis de serem tratadas de forma diferente.
Em relação ao tal bairro de Loures, nem sei por onde começar: desde pessoas que não mostram o mínimo de respeito pela sociedade onde vivem e atropelam a lei por se sentirem impunes, passando por justificações académicas totalmente desenquadradas e terminando em meios de comunicação social que preferem fazer uma espécie de telenovela de tudo isto, há algo que sobressai - como se nos estivessem a dizer "eles são diferentes, temos de ser compreensivos", o que na prática significa "neste caso, a lei é diferente", e a partir do momento em que se admite a formação de "comunidades" [que não existem], entra-se num vazio perigoso onde rapidamente a lei é posta de parte e entram em campo teorias sociais que em nada contribuem para a resolução deste problema - porque razão existem tantas armas naquele bairro? Porque motivo um desentendimento levou a um tiroteio? É justificável que tenha havido um tiroteio apenas com o argumento de que são "comunidades" que "não se dão bem"? Já agora, porque não são sinceros e não dizem abertamente que a violência faz parte da "cultura cigana"? É claramente o que pensam e seria uma forma de clarificar tudo aos olhos do público e de justificar o tratamento que as autoridades dão aos "membros" da chamada "comunidade cigana"...
Ou estamos apenas perante uma desresponsabilização total das autoridades e das pessoas envolvidas, acompanhada da ignorância de muitos que acompanham estes casos e que parecem estar convictos de que se deve tratar de forma diferente pessoas que são "ciganos" e "africanos", sem aplicar a lei e permitindo que os bairros sociais se tornem locais sem ordem para depois afirmar que "não se podem criar guetos", quando na verdade, não estão preparados para tratar as "comunidades" com a mesma lei com que a maioria da população portuguesa é tratada?
1 Comments:
Exactamente! É por a lei não ser aplicada a TODOS, como se quer numa democracia, que estas situações se multiplicam. Por quanto tempo mais teremos de aturar os estatutos de ''etnia'', ''raça'', ''diferença'', etc?
Faz lembra o governo totalitário da obra 1984 (''Socing'', na tradução portuguesa), segundo a qual havia dois estatutos; o de cidadão, que estava sujeito à lei, e o de proletário, que por ser demasiado pobre e ignorante para constituir ameaça para o regime, vivia de forma marginal.
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