8.8.06

Revolução foleira

Eu não sei ao certo quais são os futuros planos dos fabricantes de telefones móveis, e se soubesse estaria a trabalhar para um deles, logo não poderia escrever isto, mas não consigo compreender qual a verdadeira motivação dos consumidores para adquirirem aparelhos com certas características.
Ainda antes da afamada Terceira Geração, aquela que poderia ter rendido ao estado português uma receita muito superior da que foi auferida aquando da venda da licença, tivemos os telefones com WAP. Sim senhor, o meu telefone tem WAP mas não sei muito bem para quê até porque nunca até agora utilizei tal serviço, talvez porque nunca tenha sido necessário da mesma forma que não conheço ninguém que dele necessite. Depois surgiram os écrans a cores [ok, nada contra isso, apenas desperdiça mais bateria] e os toques polifónicos. Toques polifónicos? Mas que raio é isto? Simples, trata-se de uma simulação através de um determinado conjunto de sons, de uma melodia real. Isto veio substituir os toques monofónicos que existiam até então e que consistiam num conjunto de sons simples que imediatamente associávamos ao telefone.
A seguir aos toques polifónicos vieram os toques reais, e aqui foi a desgraça total. Se quando os telefones móveis explodiram ao ponto de qualquer vendedora de fruta e peixeira analfabeta do mercado da Ribeira exibir um com o toque da abertura de Guilherme Tell já foi irritante, os toques polifónicos agravaram a situação e os toques reais destruíram toda a seriedade que aquele aparelho ainda tinha. Não só tornou possível que músicas verdadeiras se pudessem transformar em toques, ao ponto de não se distinguir de uma aparelho de reprodução de som qualquer, como ainda permitiu a gravação de sons para serem utilizados como toques…e isto foi o golpe de misericórdia na respeitabilidade do telefone móvel. Eu não sei o que é que vocês acham, mas eu se fosse um telefone preferia alertar o meu dono para a existência de uma chamada através de um som vulgarmente associado a um telefone que o fizesse atender, em vez de o agoniar com uma música da Shakira ou através de uma sinfonia de peidos.
Depois, temos os wallpapers e as imagens dos ditos telefones…meus deuses, haverá forma mais patética de tratarmos os nossos aparelhos de comunicações do que enfeitá-los com imagens foleiras de corações voadores, carros modificados, emblemas de clubes, logótipos de bandas e pseudo-artistas ou mensagens que fazem um puto infeliz parecer um chulo de primeira? Uma pergunta simples e directa: quem é que pagaria por um wallpaper para o computador? Vocês pagariam um euro que fosse por uma imagem para estar no fundo do écran do vosso computador?
Quanto às fotos…ora bem…tirando o facto de que durante anos tinham um décimo da qualidade de uma máquina fotográfica comum, que as incompatibilidades entre redes tornavam o seu envio frustrante, que o alto preço daquele mesmo envio era desmotivador e que se até aqui já corríamos um risco de ver a nossa privacidade invadida quando saíamos à rua, agora esse risco foi multiplicado por cem mil…ok, à excepção de tudo isso, eu não tenho nenhum problema com as máquinas fotográficas em telefones.
Depois vieram os vídeos…filmar com um telefone…uma grande parte da minha opinião quanto a isto pode ser lida no parágrafo anterior, mas há mais. A possibilidade de fazer pequenos filmes com os telefones torna cada fedelho com um telefone destes [aqueles fedelhos que os pais precisam do dinheiro da segurança social para viver mas que oferecem aos putos telefones de terceira geração quando eles fazem 9 anos, tão a ver? ] numa esperança do cinema. Ou isso ou torna-os em possíveis alvos de assaltos, mas vai dar ao mesmo porque depois o mangalho que o assaltou herda a esperança da sétima arte que até então pertencia à vítima. Ora, a possibilidade de filmar com o telefone abriu novas perspectivas àqueles que o podem fazer. De facto jovem, já podes ficar para a posteridade com o momento em que engravidaste aquela pita de 14 anos da tua turma, com som e tudo! Mas não é tudo, com estas maravilhas da tecnologia é possível assistir a reuniões de pitas nos restaurantes e discotecas à volta do telefone a fazerem as suas curtas-metragens [que na minha sincera opinião se deviam chamar “Batemos com a cabeça num pilar de cimento até ficarmos com uma fractura exposta e agora veneramos um objectozinho a que gostamos de chamar telemóvel”, partes 1, 2, 3, 4, 5, por aí fora]. É fantástico que agora a Sorraia Vanessa, a Lucinda Andreia e a Ágata Isabel possam mostrar as suas lesões cerebrais e problemas mentais ao Mundo sob a forma de vídeos filmados com um aparelho de comunicações pouco maior do que um maço de cigarros.
E agora, eis que chega a estela no firmamento da Revolução Foleira no mundo das telecomunicações. Meus caros, chegou a TV móvel. É exactamente o que o nome diz, ver televisão no seu telefonezinho. Imagine que vai no autocarro muito bem sentadinho a caminho do emprego, e para quebrar a monotonia saca do seu orgulho e começa a ver a MTV, a RTP1 [quantos de nós não queriam estar a ver a Praça da Alegria no autocarro?], a CNN [para podermos esclarecer o velho resmungão sobre o Médio Oriente] ou a Playboy TV [vamos lá ver, quantos homens querem mesmo ter uma erecção em pleno autocarro? Suponho que será útil, sempre podem dizer às fêmeas “eu não a apalpei, eu estou a fazer uma coisa no meu telefone“] que eu suponho que vá reunir a preferência de uns bons 99% dos utilizadores do serviço.
Não sei se já pensaram nisto, mas enquanto estas inovações significam milhões para os fabricantes, elas podem resultar em milhões…de perdas para os empregadores dos utilizadores. É verdade que muitas empresas bloquearam o acesso à internet a partir dos computadores dos seus empregados para garantir uma produtividade mais elevada. Mas é inconstitucional proibir os funcionários de levaram o seu orgulho, a sua miniatura, o seu bebé digital com eles para o local de trabalho. Qual vai ser o resultado quando o funcionário A passou uma boa parte do seu tempo a ver televisão no écran do telefone, ou a jogar ou a navegar na web enquanto fingia estar ocupado no computador da empresa? E nem sequer cheguei ainda aos telespectadores que irão utilizar o serviço de televisão móvel para ver um jogo de futebol no carro porque estão presos num engarrafamento, ou para poderem ver o trânsito quando saem de casa de manhã, boa sorte, pode ser que apareçam nas notícias!

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