21.8.06

O enterro da morte

Uma cerimónia fúnebre é sempre um momento de bastante consternação na nossa realidade, exceptuando talvez para aqueles que ansiavam que o falecido esticasse o pernil, mas isso é outra história.
Ao enterrar um morto, a família fica suspensa no tempo. Não há passado, não há futuro, há apenas a visão de um caixão com o corpo do seu parente a ser colocado debaixo da terra e um luto generalizado.
Quase parece inaceitável que assim não seja, toda a gente pede “respeito” embora eu não saiba muito bem o que essa palavra significa. Ao enterra um familiar, a família pretende simbolizar não propriamente o fim de um ciclo e o início de outro, mas o próprio enterro de um familiar representa uma suspensão no tempo. Talvez uma crença sublimada de um regresso, uma vez que tudo o que é enterrado o foi com o objectivo de ser recuperado um dia. Ou uma forma de reconhecimento, garantindo-lhe um lugar nesta terra, até após a morte.
Seja qual for a motivação, nenhuma delas é um ritual de passagem, é apenas uma celebração dolorosa e deprimente com um objectivo pouco claro. Durante a cerimónia, apenas têm lugar lamentações e manifestações de luto, não pela pessoa mas pelo evento. Não representa de maneira nenhuma o passar para uma nova realidade ou um novo futuro [não desejado, note-se] mas sim apenas um sentido moral de enterrar o falecido e de deixar o seu corpo apodrecer com o tempo.
É por isto que eu defendo a cremação, pura e simples. Após a morte, os nossos corpos não devem ocupar espaço na Terra, já fizemos isso em vida. Devemos todos ser reduzidos a cinzas após a morte uma vez que não faz sentido enterrar um corpo como forma de o honrar. Reduzir um corpo a cinzas, pelo contrário, representa o fim de uma era e o início de outra, a substituição do papel daquela pessoa e a consequente renovação. Da mesma forma que de uma floresta reduzida a cinzas se ergue outra, anos depois, a cremação de um falecido representa uma passagem para o futuro e uma transição dolorosa mas necessária. Afinal, nenhum de nós possui o dom da fénix.

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