8.9.06

A guerra que nunca foi

Há cerca de cinco anos atrás, o presidente dos EUA anunciou ao Mundo que a sua maior prioridade seria a chamada “guerra ao terrorismo”, foi sob este nome que a administração Bush designou as acções consequentes aos acontecimentos de 11 de Setembro de 2001 e que considerou como sendo as palavras que os americanos mais queriam ouvir.
A expressão é um erro, sobretudo porque não houve nenhuma guerra ao terrorismo, nem o
próprio terrorismo foi afectado por esta decisão de Washington.
A forma como os EUA lidaram com os atentados que se aproximam do seu quinto aniversário foi incorrecta desde que se aperceberam de que estes estavam em escala. Lidaram com os acontecimentos como se do primeiro atentado terrorista da história se tratasse - erro, há centenas de anos que esta actividade existe e o que aconteceu a 11 de Setembro de 2001 que o distinguiu de outras acções terroristas foi a quantidade de vítimas e a transmissão televisiva em directo.
A reacção dos EUA obedeceu, no geral, à de uma guerra tradicional entre estados - erro, apesar de a administração Bush saber que os executores dos atentados não eram um inimigo tradicional, a forma como responderam atacando o Afeganistão foi uma resposta de “guerra tradicional” entre estados. Neste caso, foi positivo para os afegãos deixarem de ter o movimento taliban a dirigir o seu país mas se a coligação internacional tivesse tido o sucesso desejado, o Afeganistão seria hoje um país em paz e com boas perspectivas de desenvolvimento.
O principal objectivo dos EUA nesta guerra que nunca foi, era destruir a al-Qaeda e capturar ou eliminar o seu líder - erro, como já foi demonstrado, a estrutura da al-Qaeda que esteve por detrás dos atentados já não existe mas isso não significa que a ameaça tenha diminuído. Pelo contrário, o efeito da retaliação americana levou a que aquela estrutura que se encontrava largamente concentrada no Afeganistão com células na Europa e nos países islâmicos se fragmentasse em inúmeras “secções” com um potencial de ameaça muito maior. Não é preciso muito para justificar esta afirmação, basta olhar para Bali, Istambul, Madrid, Londres e Jordânia para compreender isto, ou se quisermos, para o quotidiano do Iraque.
Os EUA inseriram a invasão do Iraque no âmbito do combate ao terrorismo - erro, como já foi demonstrado não só o regime iraquiano não constituía uma ameaça para os EUA, como as ligações à al-Qaeda ou outras correntes terroristas transnacionais nunca foram provadas. A invasão teve, aliás, o efeito contrário - com o derrube do regime iraquiano, o vazio de poder que le sucedeu permitiu que o Iraque se tornasse num campo de treino de acções terroristas e num potencial estado islâmico de influência iraniana, além de ter conseguido formar uma forte corrente anti-americana em todo o Mundo. Por tudo isto, a invasão do Iraque foi um triplo erro.
Quais as consequências destes erros para os EUA? Todo o capital de confiança e de solidariedade que conquistaram imediatamente após os atentados foi reduzido a uma fracção residual. As correntes anti-americanas, quer na teoria, quer na prática, foram presenteadas com um cenário ideal às suas acções, e que se manifestou na eleição de líderes anti-americanos e no crescente apoio popular, sobretudo nos países maioritariamente islâmicos, das acções contra os EUA. A fragmentação da al-Qaeda levou a que atentados com a envergadura dos de 11 de Setembro não se repetissem mas fossem antes substituídos pela proliferação de atentados realizados sob influência ou até mesmo inspiração da al-Qaeda. Como já aqui disse, Bali em 2002, Istambul em 2003, Madrid em 2004 e Londres em 2005 sofreram estas consequências.
Apesar das palavras de George Bush, o Mundo não é um lugar mais seguro hoje, nem mesmo os EUA estão mais seguros - foi louvável a forma como no passado mês de Agosto, as autoridades britânicas e americanas impediram a destruição de vários aviões utilizados em voos transatlânticos, mas isto apenas demonstrou que passados cinco anos, não diminuiu o grau de perigo de um novo atentado de grande envergadura e se um atentado foi hoje evitado, amanhã outro pode não ser.
Apesar de tudo, a administração Bush apresenta estes resultados como vitórias. Não é surpreendente, se considerarmos que esta foi reeleita em 2004 e as suas linhas de base para os EUA foram satisfeitas, assim como os desejos pessoais dos seus membros - nomeadamente os que mais lucraram em capital financeiro e político com os atentados de 11 de Setembro, o governo norte-americano tem todos os motivos para estar satisfeito.
A chamada “guerra ao terrorismo” nunca existiu, nem vai existir. Se tivesse existido, hoje a ameaça terrorista estaria virtualmente extinta, mas a verdade é que nos últimos cinco anos, foram registadas centenas de atentados terroristas, cujos objectivo foi simplesmente provocar a maior quantidade de danos materiais e humanos possíveis. Será isto um sucesso da administração Bush?
É certo que Bush ficará na História dos EUA e na História Universal, mas não como o presidente que contribuiu para a destruição da ameaça terrorista, antes como o líder que perturbou e em última instância arriscou a segurança mundial em nome de uma frase vazia de conteúdo.

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